WEB ARTISTA de Junho:

JOESÉR ALVAREZ/ BRASIL

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Português / Espanhol:

1- BIO E INFORMAÇÕES:

Sou Joesér Alvarez, media artist, Rio de Janeiro, 1962. Aprendi a desenhar
muito cedo, aos 9 desenhava como Michelângelo, mas aprendi a pintar muito tarde - Picasso aos 12 era muito melhor do que eu aos 33.
Aprendi escultura trabalhando numa fundição de ferro, e gravura com alguns gravadores em Florença. Trabalho com arte digital desde 94, net.art desde 2001.
Atualmente me interessam as questões conceituais da artemídia na cibercultura.

Vivo na periferia da Amazonia, que é periferia do Brasil. trabalhei durante 11 anos nos garimpos de ouro, ganhei algum, toureando a morte várias vezes, conhecendo-a de vista, pelo cheiro e às vezes por um fio. Um de meus últimos trabalhos, fo vídeo Marmól, feito em parceria com o poeta Carlos Moreira, traduz melhor essa minha pulsão.
Pra saber mais sobre mim, só perguntando, mesmo... ;-)
Pra ver outros trabalhos meus:

http://www.enter-net.com.br/linealvarez/bio.html


2- TRABALHO:

Sou um voyeur assumido. Toda imagem me interessa. Todo texto capaz de gerar imagens também. Gosto das ferramentas randômicas que me permitem brincar de Deus, extraindo signos do caos, formatando personagens possíveis, combinando infinitas cores, texturas e formas. Gosto especialmente das core explosivas de Van Gogh, da paleta de Monet. Nesse sentido, procuro atuar como um renascentista da era digital, experimentando mídias, formatos, campos, quais sejam, limitado apenas pela falta de mecenas. Aprendi a apreciar o uso da figura humana por Bacon, Jean Rustin, Goya, Frida Kahlo e Lucien Freud, eles me tocaram com o básico da vida: a dor de ser humano.De estar dia a dia lutando contra a morte. Não a morte do corpo, inevitável, mas a do pior tipo: a morte do espírito. Procuro refletir sobre ela em alguns de meus trabalhos, porque isso me diz muito da aventura de estar vivo, permanecendo através da arte, mesmo depois do corpo, ainda que brevemente sobre a terra.


TERCEIRA RESENHA COLABORATIVA

Trabalhos:

Mármore

http://www.iis.com.br/~regvampi/video/black.htm

E

Scalpoema

http://www.iis.com.br/~regvampi/museu/


1- La poética mortuaria de Joesér Alvarez

Por Nilda Saldamando-Diaz

he conocido la poética mortuaria de Joesér Alvarez en dos momentos : uno.. audiovisualmente .... y otro... visualmente ... me he sentido invitada al mausoleo de la vida transformada en muerte de una para necesidad de otra... ...
un hombre joven a edad plena para la eternidad de su mito belleza mirándome desde la quietud de su esfinge ... transitoria quietud alterada en el transcurrir de los segundos .... para esa otra esfinge leyenda descarnada sucesora la de más plena y definitiva edad para nuestra historia .... la voz reza sus versos oficia la ceremonia con su propia sinfonía de época .... fotos liberadas de su cronología impresa transitan el espacio en su calidad
de testigos de una acogedora tierra inevitable . . . . . . resguardo
testimonial de la memoria más oculta ....más antigua .... acudo al
silencio del oficiante y su sinfonía ...... para otro inicio al negro
espacio inmenso .... en silencio .... giradoras calaveras restos meteoritos de que tribu humana nuestra conjurando el ritmo de transformación al joven esfinge consumándose entre las manos columnas de siempre pilares nuestras por un momento en silencio .... mis propios latidos entre mis huesos en silencio para las esfinges de mi historia ...... entre mitos y leyendas comprimiéndose extendiéndose sus versos epitafios ..... movimientos imperceptibles de mi propia vida transformándose aquí ..... sabedora de un lugar en este mausoleo mármol señalado sobre la tierra transformándose en el espacio ...

Emocionada meditante .... por tal intensa calidad de sugerencia poética.... termino el ritual hermanada de humanidad creadora


2- A morte é um problema dos vivos?

Por Regina Célia Pinto

"Emocionada meditante .... por tal intensa calidad de sugerencia poética
.... termino el ritual hermanada de humanidad creadora"

(Nilda Saldamando-Diaz)

A poeta experimental Nilda Saldamando-Diaz enviou-nos uma fabulosa resenha poética sobre o fazer artístico de Joesér Alvarez. Também emocionada, não só por "Mármore" e "Scalpoema", mas também pela sensibilidade e acuidade de Nilda Saldamando-Diaz ao descrever o trabalho desse artista, tento agora, humildemente, expressar a minha opinião.

Conheci esse ser inquieto, o artista Joesér Alvarez em 2001, através do "Projeto Fronteiras", da então revista "Arteonline". Sempre me admirei dessa sua constante inquietude e busca de vida - a boa vida do espírito - aquela constante procura de ser um mais que ser. A primeira informação que recebi dele é que fazia parte do Grupo Madeirista. Naquela ocasião ele me enviou o Manifesto Madeirista. A palavra Madeirista vem do Rio Madeira, que atravessa a Amazônia brasileira, onde vive Joesér Alvarez. Devo confessar que fiquei admirada de conhecer um grupo tão articulado fazendo arte na Amazônia. Preconceito talvez de quem mora numa das capitais culturais do país?... Aos poucos fui me admirando mais, Joesér Alvarez é artista dos mais atualizados e sensíveis, e possui uma criatividade muito especial. Além disso, sabe sempre de todas as oportunidades que circulam pela Internet e, geralmente é ele que me avisa de eventos interessantes. Gosto imensamente dos seus trabalhos, e sempre os julgo muito inteligentes. Salve a WEB, que eliminando fronteiras, me deixou conhecer Alvarez e o tornou um artista internacional.

É curioso a sua pesquisa estar relacionada à morte. Como já dissemos, ele vive às margens do Rio Madeira. Gaston Bachelard, no seu livro "A água e os sonhos" comenta que "o devaneio acaba no âmago de uma água pesada e sombria que transmite estranhos e fúnebres murmúrios. Todo poeta que sonhe à beira de águas como essas, reviverá imagens submersas, reencontrando possivelmente seus mortos." Nunca vi o Rio Madeira, mas não o imagino com águas límpidas com reflexos imensos e música cristalina. Vejo-o muito mais com águas pesadas e escuras. Estaria no Madeira o fundamento da pesquisa de Alvarez? A Natureza influenciando a Cultura?

A religião, a metafísica e, mais além, a cultura como um todo, tentaram entender o conceito de morte. A filosofia de Platão até Montaigne tem afirmado que é na meditação contínua sobre a morte que reside a exata relação com ela. A pesquisa áudio-visual de Joesér Alvarez baseia-se nessa reflexão e isso foi magnificamente enunciado por Carlos Moreira, seu parceiro em "Mármore": "o sol branco do osso na imensa treva da carne."

"Não a morte do corpo, inevitável, mas a do pior tipo: a morte do espírito. Procuro refletir sobre ela em alguns de meus trabalhos, porque isso me diz muito da aventura de estar vivo, permanecendo através da arte, mesmo depois do corpo, ainda que brevemente sobre a terra." (Joesér Alvarez)

Com essa afirmação o nosso artista mais uma vez se aproxima de Gaston Bachelard, que poeticamente diz que os sonhos que viveram na alma de uma pessoa continuam vivos em suas obras.

Bem, concordo com os dois no que se refere à pintura, à escultura, à literatura, à poesia, às tradicionais formas de arte. Contudo, a invenção do computador está produzindo uma nova arte ou muitos novos movimentos na arte... Estamos, a meu ver, no meio de um rodamoinho de mudanças. Além disso, a fantástica velocidade com que a tecnologia se desenvolve nos faz imaginar que daqui a dez anos, tudo o que fazemos hoje estará completamente obsoleto. Já existem grupos interessados, com muita razão em preservar essa nossa cultura digital mas, pelo menos dentro de mim, talvez porque não participe de nenhum desses grupos, pairam muitas dúvidas se isso será possível. Termino então com o realismo de Fernando Pessoa:

"A luz apagou-se.
Que me importa que o homem continue a existir?
"

O que seria a morte no ciberespaço? Morte de pixels, morte de softwares, senhas perdidas, ids esquecidas?... Morte da nossa cultura digital?...

(aberto à discussão)


Acid-Free Bits: Recommendations for Long-Lasting Electronic Literature

por Nick Montfort and Noah Wardrip-Fruin

A Electronic Literature Organization anuncia a publicação de "Acid-Free Bits", um conjunto de princípios e normas para a criação e duração de trabalhos digitais. A ELO espera que esse panfleto estimule o debate sobe a natureza e o futuro dos trabalhos digitais entre artistas , escritores, pensadores, instrutores, estudantes e bibliotecários.

"Acid-Free Bits" está disponível para imprimir no site da ELO:

http://www.eliterature.org


3-Um primeiro olhar sobre o SCALPOEMA de Joesér Alvarez

Por Regina Célia Pinto

Scalpoema (158 KB) é um dos melhores trabalhos na web que tenho visto apesar da simplicidade de sua forma. Começando pelo título que vem de escalpo e remete à construção do poema que é obtida com o recorte de algumas palavras de uma sentença muito especial porque é um fragmento de "Memórias Póstumas de Brás Cubas", 1881 por Machado de Assis. ( ". . . the greatest author ever produced in Latin America . . ." / Susan Sontag, The New Yorker, May 7, 1990, p. 107):

"Ao primeiro verme que roeu as frias carnes do meu cadáver, dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas."

O texto acima permanece na tela por alguns minutos e em seguida, as palavras vão desbotando e se alternado. Então, a primeira sentença se transforma em outra:

"Ao VER-ME quero ver além desta memória posta."

Atenção: VERME = GUSANO e VER - ME = Ver a mim mesmo

Um jogo de palavras muito interessante! Vale uma visita e comentários!

Memórias Póstumas de Brás Cubas

Considerado o marco inicial do Realismo brasileiro — e também da segunda fase da produção machadiana —, Memórias póstumas de Brás Cubas contém 160 capítulos de extensões variáveis. É um romance originalíssimo para a época, a começar pelo tipo de narrador, um defunto que, entediado de sua condição e da eternidade, põe-se, do túmulo, a rever sua existência.

Faça o download da obra completa, em Português


4- Scalpoema, um Segundo Olhar e Conclusão

Por Regina Célia Pinto

Todos devem estar lembrados que Joesér Alvarez inicia o seu Scalpoema com esse fragmento de texto que também inicia "Memórias Póstumas de Brás Cubas" de Machado de Assis :

"Ao primeiro verme que roeu as frias carnes do meu cadáver, dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas."

"Deixa lá dizer Pascal que o homem é um caniço pensante. Não: é uma errata pensante, isso sim. Cada estação da vida é uma edição, que corrige a anterior, e que será corrigida também, até a edição definitiva, que o editor dá de graça aos vermes." (Memórias Póstumas de Brás Cubas, cap.XXVII)

O Brás Cubas egoísta, arrogante, irresponsável, rico, volúvel e mal acostumado, que empurrou a ociosidade e o tédio a vida inteira, de certa forma vai se redimir desses "predicados", transformando-se no narrador que se expõe e enfim mergulha, de forma crítica, no grande vazio de sua existência. Ou, dizendo de outro modo: ao rever a vida pelo olhar desiludido mas perspicaz de seu autor, Brás Cubas até recupera um pouco de sua dignidade perdida e, pelo fato de já estar morto, pode, não apenas contar suas memórias, mas contá-las por inteiro...

O poema escalpo de Joesér Alvarez consegue, através de uma singela animação, alguns escalpos (cortes e substituições de palavras) condensar em uma única frase, magnificamente, todo esse processo narrativo:

"AO VER - ME QUERO VER ALÉM DESTA MEMÓRIA POSTA"

É realmente extraordinário observar e comparar as duas narrativas, a do século XIX, e do século XXI! Scalpoema é um momento extraordinariamente iluminado dentro da obra de Joesér Alvarez.

Em Memórias Póstumas de Brás Cubas, nem mesmo a morte, o mais profundo choque da experiência humana individual, representa qualquer impedimento narrativo, mas, muito ao contrário, propicia aqui o afastamento ideal para que essa vida possa ser passada por um retrospecto avaliatório.O sentido da vida só pode ser revelado se entrelaçado à idéia de morte. Da mesma forma temos que pensar no sentido de nossa cultura digital (vida) entrelaçando-o com à obsolência de softwares e máquinas (morte). Devemos parar de produzir o que estamos produzindo ou utilizar recursos mais simples para que nossa obra perdure no tempo? Bem, quem visitou http://www.eliterature.org, encontrou lá algumas sugestões. Sugiro que visitem também:
http://www.variablemedia.net .

Uma das conclusões a que se chega é que para preservar artes em formatos efêmeros o artista deve procurar sempre descrever o seu trabalho em um meio que seja independente e não efêmero, pois assim será mais fácil traduzir para novos meios, as obras cujos meios vão se tornando obsoletos.

Seria também interessante pensar, que podemos ainda assistir e nos maravilhar com filmes dos primórdios do cinema. Entre eles gostaria de citar dois de meus favoritos: Metrópolis de Fritz Lang e Intolerance de D.W. Griffith. Creio mesmo que ainda hoje é difícil encontrar alguma narrativa cinematográfica ou multimídia que os supere. Sendo assim, me parece que o que realmente é bom e inovador permanece.

Gostaria de encerrar essa resenha lembrando que existem outros tipos de arte que são por natureza efêmeros: as Performances e Instalações. Os artistas interessados nessas formas de comunicação não deixam de realizar esses tipos de arte, mesmo sabendo-os efêmeros. Se forem de boa qualidade performances e instalações continuarão vivas na memória de quem as assistiu
e, para quem não assistiu, restam as fotos e descrições. Eis aí novamente o perpetuar do que não é eterno em um meio que é independente e não efêmero...


5- Falando em Morte no Ciberespaço...

Joesér Alvarez nos enviou essas informações duas vezes, o primeiro e-mail está mortinho por aí em algum canto da rede. Transcrevo abaixo o segundo , com o mesmo texto do primeiro, mas que encontrou seu caminho para a nossa caixa postal, embora tenha nos alcançado com a resenha já concluída:

"Em meados de 1996, quando a temática amazônica (para inglês ver) predominava em meu trabalho e algumas questões de ordem social se impunham em minha reflexão estética, foi que Thanatos começou a aparecer mais explícitamente. Foi o caso do Conflito de Corumbiara, no Estado de Rondônia, durante o auge dos conflitos agrários na década de 90, onde morreram oficialmente 09 pessoas, em decorrência de um enfrentamento de sem-terras com a força policial apoiada por jagunços. Alguns meses antes havia ocorrido o Massacre de Eldorado dos Carajás, no Pará, onde haviam morrido 19 pessoas.


Sempre fui simpatizante dos movimentos populares, e naquele período participei de algumas manifestações contra a chacina, trabalhando com o material gráfico, o que acabou redundando em alguns desenhos, esculturas e telas como reflexo daquela temática.

assentados

Em 2001, três dessas telas participaram de uma exposição itinerante pelos EUA: http://www.valweb.org/3americas/Americas3.htm

Como também admiro o trabalho da Anistia Internacional, acabei cedendo os direitos autorais dessas imagens àquela instituição.

A temática da morte voltou novamente, ainda com cunho social, durante uma exposição de arte correio http://anilina.virtualave.net/obras_mapuche2.htm contra o genocídio do povo Mapuche no Chile, com a qual contribuí casando o Morte/Vida Severina de João Cabral de Melo Neto (um de meus poetas preferidos naquela época) com algumas palavras ditas por autoridades chilenas, que afirmavam ter terra suficiente para os Mapuches:

De outra forma, em 2001,durante as discussões online do Grupo Fronteiras, certo dia, começaram a surgir alguns "cadáveres esquisitos", o que me pareceu dinamizar a troca de idéias e a sociabilidade entre os participantes, dando uma vertente divertida à temática do Thanatos, como que, uma celebração à vida - o principal culpado por essa abordagem chamava-se Paulo Villela, cujo corpo digital foi livremente apropriado para uma dissecagem à La Dr. Tulp...

Estávamos no meio dessa farra, quando ocorreu o 11 de setembro, e daí já não havia mais graça em brincar com a morte, mesmo porque, nos superaram em muito, a obstinação insana do terror em suas duas faces, nas torres e no Afeganistão. O que fizemos? O que poderíamos fazer? A minha catarse pra superar essa loucura foi o clip-poema "Agora", dentro da proposta da Mostra Estética da Tragédia, feita por Regina, o que nos ajudou a refletir e talvez, superar ainda que infimamente, nossa impotência diante de tanta violência. Ainda não satisfeito, criei meu primeiro e único game: Wargame, que tenta também, dentro de uma proposta "artivista", colocar alguns grãos de areia no prato da paz que pende cada vez mais contrário na balança, daí passei para o Projeto Século XXI, que conta com a colaboração de diversos artistas os quais refletem através de imagens os rumos de nossa espécie.

Tem razão Regina Pinto em seu texto, quando menciona a influência de uma água escura e pesada em meu fazer artístico, pois ele é muito presente no meu cotidiano: bebo sua água, vejo--o todos os dias, e sabe-se lá quantas vezes escapei de virar comida de peixe. Penso nele como uma metáfora da vida, em fluxo, que nasce em algum ponto dos Andes e deságua no mar, metáfora maior da diversidade e da pluralidade, das redes digitais que nos aproximam tanto, como as palavras de Nilda Saldamano nos tocam - poesia sobre poesia, fluxo sobre fluxo, potencializando os sonhos, o desejo, a vontade.
Assim, de modo diverso, deixei Thanatos vir à mesa, ora dialogando com o mais profundo de minhas indagações ontológicas, ora com uma poética engajada, tentando fazer alguma diferença num mundo cujos grupos sociais cada vez mais lutam por privilégios semelhantes sendo ao mesmo tempo imensamente desiguais. O "Madeirismo" é isso. Não basta um rio, não basta uma cidade. É preciso fazer ouvir sua voz.


Onde está?